Descarbonização do Ambiente Construído

Desafios e Oportunidades

As mudanças climáticas representam um dos maiores desafios globais deste século, impulsionadas principalmente pelo aumento contínuo das concentrações de dióxido de carbono (CO₂) na atmosfera, evidenciando a relação direta entre o crescimento das emissões globais e o aumento da temperatura média do planeta. Eventos-chave, como a adoção do Protocolo de Kyoto (1997) e do Acordo de Paris (2015), destacam marcos internacionais no esforço para mitigar os impactos das mudanças climáticas. O Acordo de Paris, em particular, estabelece metas ambiciosas para limitar o aquecimento global a 1,5°C, reafirmando a necessidade de uma transição para práticas mais sustentáveis e resilientes.

No Brasil, o aumento das temperaturas segue as tendências globais, evidenciando desafios regionais específicos em relação às mudanças climáticas. Como um dos signatários da Declaração de Chaillot, apresentada em 8 de março de 2024 durante o Fórum Global sobre Edifícios e Clima, o país reafirma seu compromisso com a descarbonização e resiliência climática no setor de edificações. Esse compromisso envolve a implementação de roadmaps, estruturas regulatórias para construção e energia, além do estímulo à pesquisa, desenvolvimento de soluções inovadoras e uso de materiais de construção de baixo carbono.

A Declaração também destaca a importância de uma governança multinível, promovendo a coordenação entre diferentes partes interessadas e incentivando uma abordagem participativa. A integração de iniciativas globais e regionais é essencial para garantir um futuro mais sustentável. O setor de edificações, por sua vez, pode desempenhar um papel importante na redução das emissões de carbono, contribuindo para as metas do Acordo de Paris por meio de ações conjuntas entre governos, empresas e sociedade. A integração de iniciativas globais e regionais é essencial para garantir um futuro mais sustentável e alinhado aos objetivos climáticos.

Concentrações de CO2 Atmosférico versus Mudanças de Temperatura Global e Acordos Internacionais

Fonte:  Mauna Loa Observatory, dezembro 2021, Institution of Oceanography & NOAA Global Monitoring Laboratory / IPCC 2018

O ambiente construído, que inclui edifícios, infraestrutura e espaços urbanos, é responsável por uma parte significativa das emissões globais de carbono. De acordo com dados internacionais, as edificações respondem por cerca de 37% das emissões de Gases de Efeito Estufa (GEE), impactando diretamente as mudanças climáticas. No entanto, esse número pode não refletir completamente a realidade brasileira, devido a diferenças importantes, como a matriz energética do país e os padrões de consumo de energia, além da gestão dos recursos naturais, que variam em diferentes regiões.

Fonte: Global ABC 2022 Global Buildings and Construction, IEA 2022. Adapted from “Tracking Clean Energy Progress”  (IEA 2022f).

O Desafio de Compreender o Perfil de Emissões no Brasil

Para enfrentar o desafio da descarbonização, é essencial compreender o perfil de emissões do ambiente construído no Brasil. Embora as diretrizes globais forneçam uma base, elas não refletem as especificidades do nosso país, que já gera 85% de sua energia a partir de fontes renováveis. Por outro lado, as características das construções brasileiras podem gerar impactos distintos dependendo da localização, do tipo de uso e das técnicas construtivas empregadas.

O Grupo de Trabalho (GT) de Descarbonização do Ambiente Construído tem como objetivo principal estudar e discutir soluções adaptadas à realidade brasileira, com foco nas especificidades de cada região, especialmente em São Paulo. O GT busca identificar estratégias para reduzir as emissões de carbono, considerando os desafios urbanos locais, as políticas públicas vigentes e os avanços tecnológicos no setor.

Desafios e Oportunidades no Ciclo de Vida das Edificações

Desde a concepção até a operação, as decisões tomadas ao longo do ciclo de vida das edificações afetam as emissões de carbono. Nas fases iniciais, a incorporação de práticas sustentáveis, como o uso de materiais de baixo carbono e técnicas de construção eficiente, pode gerar grandes impactos ambientais desde o início. No entanto, é na fase de operação dos edifícios que ocorre a maior parte das emissões (carbono operacional), devido ao consumo de água e energia. A eficiência no uso desses recursos é, portanto, uma das chaves para reduzir as emissões ao longo do ciclo de vida de uma edificação.

Investir em práticas sustentáveis, como a adoção de energias renováveis, técnicas de economia circular e a implementação de tecnologias para eficiência energética, é essencial para alcançar um ambiente construído mais sustentável. Além disso, a escolha de materiais que minimizem as emissões de carbono durante sua fabricação e ao longo de sua vida útil é uma parte importante da solução. A implementação de normas que promovam a sustentabilidade e o uso de recursos de forma eficiente também é vital.

Calcular e relatar as emissões de carbono ao longo do ciclo de vida de um ativo construído

A Avaliação de Carbono do Ciclo de Vida Total (do inglês, Whole Life Carbon Assessment – WLCA) adota uma abordagem modular e integrada para quantificar e gerenciar os impactos de carbono em todas as fases de um ativo, incluindo benefícios e impactos além do escopo da análise. Baseada em seis princípios fundamentais — Produção, Construção, Operação, Fim de Vida Útil e Além da Vida Útil —, a WLCA oferece uma visão abrangente dos impactos em cada etapa do ciclo de vida, permitindo a identificação de oportunidades para a mitigação de emissões de carbono. Essa abordagem irá conduzir o trabalho que será desenvolvido pelo GT Descarbonização do Ambiente Construído.

Fonte: UM – Global ABC – https://globalabc.org/index.php/sustainable-materials-hub/resources/whole-life-carbon-assessment-wlca-built-environment

Sua estrutura modular permite uma avaliação detalhada, dividindo os estágios do ciclo de vida em módulos específicos que abrangem desde a produção de materiais até a gestão de resíduos. Orientada por dados, essa metodologia assegura uma análise precisa e prática, alinhada com as necessidades do projeto e com os objetivos globais de sustentabilidade. A integração dos impactos de carbono operacional e incorporado facilita a implementação de estratégias eficazes de descarbonização, promovendo uma avaliação contínua e consistente para mitigar impactos ambientais.

A  figura a seguir ilustra essa estrutura, detalhando como os impactos de carbono são reportados ao longo das diferentes fases do ciclo de vida.

Fonte: Baseado no LETI, Embodied Carbon Primer, 2020

Políticas Públicas e Planejamento Urbano Sustentável

Além das práticas adotadas nos projetos das edificações, as políticas públicas e o planejamento urbano desempenham um papel essencial na descarbonização do ambiente construído. O planejamento urbano sustentável envolve o desenvolvimento de infraestruturas que favoreçam a mobilidade sustentável, o uso eficiente de energia e o acesso a soluções verdes. Políticas públicas que incentivem a construção de edifícios eficientes, com foco na redução das emissões de carbono, devem ser implementadas de forma coordenada e integrada com o planejamento urbano.

A atuação do GT de Descarbonização do Ambiente Construído, nesse contexto, é fundamental. O grupo busca incentivar a colaboração entre entidades, governo e setor privado, para desenvolver políticas e práticas que se alinhem com as metas globais de sustentabilidade, mas que também considerem as especificidades do Brasil. A colaboração entre diferentes stakeholders é uma oportunidade para promover soluções inovadoras que favoreçam a transição para um ambiente urbano mais sustentável.

Resiliência e Sustentabilidade para o Futuro

A descarbonização do ambiente construído não é apenas uma questão de reduzir as emissões de carbono, mas também de aumentar a resiliência das cidades frente aos desafios das mudanças climáticas. As soluções sustentáveis não só ajudam a mitigar o impacto ambiental, mas também tornam os espaços urbanos mais resilientes, preparados para enfrentar eventos climáticos extremos e mudanças nas condições ambientais. Isso, por sua vez, melhora a qualidade de vida dos cidadãos, proporcionando um ambiente mais saudável e seguro.

Investir em práticas de baixo carbono e em soluções de longo prazo, que considerem as necessidades futuras das cidades, é uma das maneiras mais eficazes de garantir que as próximas gerações possam viver em um mundo mais equilibrado e com menos impacto ambiental. A atuação conjunta dos diversos setores e a integração entre políticas públicas, planejamento urbano e práticas sustentáveis nos projetos de edificações têm o potencial de transformar as cidades brasileiras em exemplos globais de resiliência e sustentabilidade.

O trabalho do GT de Descarbonização do Ambiente Construído é um passo importante nessa direção. Com soluções adaptadas ao Brasil e foco em inovação, o grupo busca promover uma transformação significativa no setor, contribuindo para a construção de um futuro mais sustentável, resiliente e equilibrado.